domingo, 26 de junho de 2011

Tempo individual

Não sei mais ser real. Me roubaram de mim e o que deixaram no lugar foram descasos com umas pontinhas de alienações e doses insensatas.
Disserto sobre desejos e ilusões sem fim que parecem mesmo não querer parar. Escolho sobrevivência e me apresentam inquietações. Não é mais como aquele receio patológico persistente de amar, ter medo e se esquivar de todos os sorrisos que tentam esbarrar em mim pelo caminho. Agora é saída. É a soma de desejos e escolhas com vontade de ser tudo. É encontrar alguém que não me aceite como metade ou parte de um sentimento, mas sim, como algo indispensável, me dando aquela sensação de ser essencial para toda a sua causa. 
Não quero ser metade. Não quero dividir conversas e sorrisos escandalosos. Quero ter para mim e que seja só meu aquele abraço. Que seja só meu aquele olhar. Que seja meu aquele fato, dia, canção, filme, reportagem... Que seja só minha aquela história. Que seja.
Cansei de temer. Cansei dos olhares que não permitem que os pés saiam do lugar sabe-se lá por qual motivo. Cansei e se o amor quiser que me encontre num bar ou na fila do banco talvez. Quero ser tudo mas não quero ser preenchida por amores platónicos. Quero amor mas sem encontrar nele algo que seja minha sobrevivência. Não vou fugir. Só por hoje não vou afastar as ilusões e a cólera que me provoca. Quero viver e de todas as possibilidades que o vento me sugerir vou tirar proveito de cada uma sem me perder completamente.

Foi cansando assim que percebi que meu tempo é particular. Não controlo nada e muito menos tenho poder para decretar quando será a hora certa. Ele tem cautela quando quer. Sabe estudar o terreno em que está entrando e não perde nenhum detalhe. Sempre olha pela janela e tenta sugar todas as informações antes de concordar com alguém que quer roubar minha atenção. Jamais permite que entrem sem bater e assim ele é vagaroso, indeciso, tomando muito mais tempo do que seria para desejar. 
Ai surge um motivo que faz com que ele perca o controle. Tempo, tempo, tempo... Não existe mais tempo. Existe urgência de ser ali e agora. Já não existe cuidado. Existe pés fora do chão e descaso com o resultado. Ah, já não há mais medo e sim a vontade de cometer erros e imprudência sem razão. Ele não se importa com mais nada e só quer viver naquela rapidez. Mal olha o terreno antes de entrar e só pensa no momento em que vai desfrutar de cada lote daquela boca.

Eu sou livre. E essa liberdade me atrai para caminhos malucos que já nem me despertam preocupações.
Eu cansei de fazer caso. Já não consigo ver nada através de uma parede imaginária e deixo que ela desabe diante de mim. Todas as ressacas e palavras não ditas, todos os sonhos esquecidos que não saem do papel. É uma tempestade de ilusões e muitas razões para não querer parar. Tudo me acompanha e me empurra pra um lugar desconhecido. Todas as coisas que odeio giram em torno de mim. Sou correta com a honestidade e fiel a minha essência, mas aceito me perder de vez naquela loucura de sábado à noite.
Me assusto fácil, mas não me importo com o modo que vai chegar. Mesmo que cause ruídos escandalosos e gestos ásperos, não me interessa. Percebi que não sou dona do meu tempo então ele que administre as coisas por mim.
Chegue leve, me avise, dê sinais de que está próximo. Chegue rápido, cause tempestades, seja pressa, tudo bem. Assim o retorno será calma do seu modo, ou desespero, o que você quiser que seja. 
É assim que meu tempo funciona. É assim que minha mente reage. Aqui está meu coração, não diga palavras incertas. Aqui está meu tempo, sua sorte é quem irá definir o modo como ele estará para você, seja pressa ou cautela.

domingo, 12 de junho de 2011

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Eu posso ser uma mentira que você insiste em acreditar ou posso ser todas as verdades do mundo. Você nunca irá saber onde está a realidade em mim, mas terá eficácia para reconhecer com clareza todas as ilusões.

sexta-feira, 10 de junho de 2011

Analisando seus olhos

- Pode começar, Elise.
- Como eu começo?
... Silêncio.
... Não foi fácil perder minha mãe tão cedo. Tive que aprender como me comportar com o mundo apenas observando o que acontecia ao redor dos meus olhos e me espelhando em pessoas que eu, segura, acreditava serem boas de verdade. Eu tinha fé apenas naquilo que fazia sentido para mim e se aquele homem era bonito ou não, isso era eu quem iria determinar, e não achar porque o resto do planeta achava. Eu era fiel ao que minha mente aceitava e era feliz por ser como Vera.
- Quem é Vera?
- Vera é um anjo. Um anjo que não tinha asas, mas por se tornar um, as ganhou merecidamente.
- Qual sua ideia sobre anjos?
- Anjos são aquelas pessoas que fizeram ou fazem algum sentido considerável em minha vida e talvez, você seja um, mas espero que não ganhe asas tão cedo.
- Acha que não mereço ter asas?
- Não. Eu acho que você ainda pode viver com asas invisíveis, pode voar se quiser, é só segurar minhas mãos. Mas Vera, não podia voar. Eu não tinha forças para carrega-la pois era só uma criança e talvez hoje, suponho que sou mais pura do que quando menina.
- Me fala mais sobre seu anjo que ganhou asas.
- Ela foi um anjo que ganhou asas por merecer, só isso.
- Como eram suas asas?
- Quando eu as via em seu corpo, eram invisíveis.
- Como via algo invisível?
- Por que faz tantas perguntas?
- Sou um analista.
- Eu vejo muitas coisas invisíveis e posso ver cada detalhe da sua vida em seus olhos agora.
- Não é fácil esconder.
- Entendo..
- Entende porra nenhuma. É fácil ver que eu te olhando vejo meu retrato ainda tão bonito. Seu sorriso continua o mesmo de sempre: triste. Parece que chora com ele e ainda não permite que ninguém te roube de você mesma. Nem ao menos eu.
- Pode me roubar se quiser, não há nada de valor.
- Pare de me enrolar com esses assuntos dispersos!
- Você prometeu. Não quebre sua promessa.
- Não posso.
- Você prometeu aceitar as condições.
- Não posso, Elise!
- Suas palavras tinham valor.
- Vejo valor nesse fio de cabelo solto em seu ombro.
- Continue.
- Não posso...
... Silêncio.
... Não foi fácil dizer adeus. Tive que aprender como era viver sem o seu cheiro no travesseiro e seus gemidos quando acordava pela manhã. Tive que procurar nas pessoas um programa de televisão interessante que prendiam minha atenção como os que eu assistia em seus olhos. Era estranho não ouvir mais a sua voz pela casa e aquele silêncio me matava todos os dias. Te amei todos os dias Elise, te amei... Não era mais engraçado assistir os programas de humor sem sua risada estranha e escandalosa que era o que mais me fazia rir. Era estranho chegar em casa e não te ver deitada no sofá com as pernas cruzadas para o alto exibindo aquelas meias que terminavam nas coxas. Era estranho chegar e não ver seus olhos passeando sobre as páginas de um livro e era doloroso não te ter ali oferecendo a ponta do sofá para que eu pudesse me sentar e alisar seus cabelos enquanto me falava o quanto aquele livro se parecia com você. Todos os seus detalhes eram gritantes, mas eu ainda podia ver algo invisível em você, sem querer ver. Eu vi suas asas, e como seu voo foi lindo...
- Nosso tempo acabou, preciso ir.
- Te amei todos os segundos que esteve ausente. Te amei em carne e osso, e agora, te amo assim: luz.
- Sinto não poder te beijar. Nos deram limites.
- Não colocaram limites em sua beleza, você continua linda. Ainda quero ter asas para segurar suas mãos e acabar com esse confim que me adaptaram até amar você.
- Não diga isso, seu tempo ainda não chegou.
- Tempo? Meu tempo era você engolindo minhas horas por dia. Quero ter asas como você!
- Prometo voltar um dia.
- Volta meu anjo... Volta...

quarta-feira, 8 de junho de 2011

Anula

Preciso de alguém que divida comigo a solidão prevendo o perigo que é ficar a sós com ela. Preciso eliminar essa mistura de confusão e ruídos que estimulam a minha vontade de escapar. É um cálculo matemático onde ninguém se atreve a resolver e, enquanto isso, meu impulso vai se tornando individual.
Estou procurando e procurar me cansa até os ossos. Estou vendendo tudo o que fui, tudo o que sou e ainda posso ser em troca de companhia. Se isso é o que me resta, vou levar só a saudade de quando fui feliz.
Aquelas cenas já sem cor que um dia causaram meu sorriso, hoje não posso ver e nem me lembrar. É utópico pensar em como era sorrir com eterna satisfação do mundo. É ilusório pensar hoje, em como eu era tão leve a ponto de ser tragada.
Pensar em me deixar aqui no sereno sem encontrar nenhum pouso colorido não é socorro, pois pensar no meu olhar sem me salvar de mim mesma é fantasioso onde nada é incrivelmente fácil.
Preciso mesmo é de alguém que segure minha mão quando aquela ânimo louco de dizer adeus vier me trazer vontade de ser lembrança. Mesmo que seja só, estou fugindo de mim para não coroar a individualidade. Preciso me esconder em alguém e quem sabe lá, encontrar o meu reconhecer.